Práticas antissindicais e ataques à liberdade de organização dos trabalhadores foram temas discutidos por escritores e juristas renomados no campo do direito sindical na noite de ontem (5), dentro da programação da Semana Edésio Passos, que acontece na Universidade Federal do Paraná (UFPR), em Curitiba.

O desembargador aposentado, consultor e escritor José Carlos Arouca, primeiro conferencista da noite, iniciou a explanação do seu tema com uma nota de repúdio aos ataques recentes proferidos pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, contra o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e, por consequência, à instituição como um todo da Justiça do Trabalho. “Nem era de se estranhar, diante da sua unidade junto ao governo neoliberal de Michel Temer, que tem como propósito acabar com a Previdência Social, conquistada ao longo de mais de 90 anos, e precarizar os direitos dos trabalhadores”, disse Arouca.

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Arouca discorreu sobre a importância da liberdade das pessoas de participarem dos sindicatos e o direito de autonomia de organização da sociedade por meio das entidades sindicais. Ele contextualizou como se deram avanços e recuos nesses direitos ao longo da história do País e abordou a percepção deles nas legislações brasileira e internacional.

Também expôs sua opinião sobre assuntos ligados ao dia a dia dos sindicatos, desmistificando questões como o dilema do pluralismo x unicidade sindical e a organização no local de trabalho. “A organização do sindicato no âmbito das empresas é o pluralismo do pluralismo e se configura em uma organização elitista. Porque ela não vai existir numa padaria, numa pastelaria, numa pequena empresa. Só vai existir nas grandes corporações internacionais”, afirmou.

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Arouca destacou que na América Latina, tirando o Brasil e Argentina, todos os sindicatos só existem no âmbito das grandes empresas transnacionais e, com isso, 80% dos trabalhadores não são abrangidos pelo contrato coletivo de trabalho. “Quem defende pluralidade?”, indagou. Na sua opinião, sindicatos e trabalhadores não são consultados ou ouvidos. Prevalecem interesses patronais, de acadêmicos e de quem comanda a veiculação de informações na imprensa.

Práticas antissindicais

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O segundo conferencista da noite, o escritor, consultor jurídico, advogado e procurador do Trabalho aposentado, Raimundo Simão de Melo, foi contundente em apontar as mais recentes práticas antissindicais e ataques à liberdade de organização sindical no Brasil, promovidos por empresas, governos, nas três esferas, e também pelo Poder Judiciário. Ele assinalou atos judiciais que inviabilizam o preceito da liberdade sindical e apontou como ataque frontal ao direito de greve os chamados “interditos proibitórios” e diversidade de liminares que estabelecem percentuais mínimos de contingenciamento durante as greves. E ainda questionou o julgamento das chamadas “greves políticas”, um preconceito pautado na desinformação em torno do direito sindical.

Simão de Melo lembrou que na última mobilização de 15 de março, em que centrais sindicais se uniram em torno dos protestos contra o desmonte da Previdência Social e das leis trabalhistas, somente no estado de São Paulo quatro liminares foram emitidas no mesmo dia, estabelecendo percentuais e multas diferenciadas para cumprimento de frota mínima no transporte coletivo da Capital.

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A primeira, estabeleceu percentual mínimo de 70% dos serviços em horário de pico e 40% em horário de fluxo normal. Em caso de descumprimento, as entidades sindicais arcariam com multa de 50 mil reais por dia; Na segunda liminar, o percentual já era de 100% no horário de pico, ou seja, ausência de greve, e 70% no horário normal, com multa prevista de 100 mil reais ao dia; A terceira das liminares trouxe à tona o debate sobre greve política e estabeleceu 100% de funcionamento dos serviços, ou seja, a proibição da greve. Também multa de 300 mil reais ao dia. Por fim, a quarta liminar do dia veio com o julgamento do percentual de 85% no horário de pico e 70% no horário normal, acompanhado do estabelecimento de uma multa astronômica de 5 milhões de reais A HORA!

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“Mesmo de caráter político, por que os trabalhadores não podem se manifestar para defender direitos trabalhistas, previdenciários e sociais conquistados a duras penas ao longo de décadas e que hoje se encontram ameaçados? Por que não podem?”, questionou o conferencista. Simão de Melo também ponderou sobre o absurdo de se trabalhar (contribuir) 49 anos para ter direito à aposentadoria integral. “Quem é o trabalhador que vai conseguir isso? Façam suas contas. O operário da Construção Civil, o motorista que enfrenta o trânsito dos grandes centros urbanos ou as estradas, sujeito ao câncer de pele e outras situações? O trabalhador rural de sol a sol? Se um movimento para defender direitos trabalhistas e previdenciários ameaçados como esses não for do interesses dos trabalhadores, será de quem, então?”, perguntou o palestrante convidado.

Simão de Melo concluiu sua apresentação abordando assuntos como as decisões do STF sobre a prevalência do direito negociado sobre o legislado e também levantou questões sobre o custeio sindical. “Está dado que o que o Congresso Nacional não conseguir fazer e aprovar pela via legislativa, a Suprema Corte (STF) vai fazer!”, concluiu.

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Para o presidente da Federação dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Paraná – Fetropar, João Batista da Silva, o debate oportunizou aprofundar o tema da liberdade sindical. Não apenas para os dirigentes das entidades que vivenciam essas situações no dia a dia, mas também para estudantes de Direito, professores e advogados presentes. “É importante discutir para diferenciar a ação sindical justa e necessária aos avanços sociais da ação partidária e, com isso, não se deixar manipular por julgamentos preconceituosos contra o exercício sindical legítimo”, disse o presidente da Fetropar. “Esta discussão foi mais um dos tantos ‘abraços fraternos’ que estamos recebendo do Instituto Edésio Passos ao longo desta semana de seu lançamento”, completou.

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O presidente da APP-Sindicato, professor Hermes Leão, disse que chamou sua atenção perceber a repetição de um processo histórico. “Houve um período em que autonomia e liberdade de organização dos trabalhadores avançaram e estamos vivenciando, hoje, um duro momento de retirada dos direitos e ataques às entidades que representam os interesses dos trabalhadores e aos movimentos populares”, disse o professor Hermes. “Saimos dessa reflexão motivados para a luta de resistência e para a defesa dos nossos direitos”, finalizou.

Direito Internacional

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O terceiro dia da Semana Edésio Passos ainda foi marcado pela sessão de autógrafos e lançamento do livro “Elementos de Direito Sindical – Brasileiro e Internacional”, de autoria do advogado trabalhista, professor da UFPR e sócio-fundador do Instituto Edésio Passos, Sandro Lunard Nicoladeli. A obra é fruto de sua tese de doutoramento e visa, entre outras coisas, ampliar a apropriação das normas, convenções e recomendações do Direito Internacional do Trabalho tanto no ensino das Ciências Jurídicas quanto no dia a dia dos julgamentos nos tribunais do Trabalho do País.

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Entre as autoridades presentes ao evento, estavam o deputado estadual Tadeu Veneri, a vereadora Professora Josete e o ex-presidente da Câmara Municipal de Curitiba, Paulo Salamuni. A coordenação da mesa ficou por conta da sócia-fundadora do Instituto Edésio Passos, Rosane Sizanoski, ao lado do presidente do IEP, André Passos.

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Na noite desta quinta-feira (6), a partir das 18h30, o tema das palestras na Semana Edésio Passos será a Resistência Democrática, com a presença do ex-conselheiro da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, advogado trabalhista Prudente José S. Melo, do ex-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) e ex-deputado federal, Aldo Arantes, e do historiador José dos Santos de Abreu, autor do livro “Operação Pequeno Príncipe”.

Confira o vídeo da transmissão do terceiro dia da Semana Edésio Passos!

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Texto e fotos: Thea Tavares.